Ao analisar
historicamente como as diferenças se constituíram no mundo, é possível
compreender os estigmas, preconceitos e o desconhecimento também historicamente
escritos pela sociedade. A visão antagônica que qualifica os portadores de
necessidades especiais como uma estrutura infra ou supra-humana teve sua gênese
no reconhecimento de mundo das diferentes épocas e povos e, sob esse enfoque,
constituíram-se também paradigmas de atendimentos no campo da educação.
Todo esse movimento
histórico até agora nos deu base para serem realizados novos estudos nas áreas
das ciências humanas, jurídicas, da saúde e tecnológica. Foi a partir do século
XX, que se começou a perceber o homem como um ser único e que na sua origem tem
o direito essencial de ser diferente dos demais. Os traços dessas diferenças
podem ser percebidos nos subsídios afetivos, estéticos, físicos, sexuais, linguísticos,
culturais e cognitivos, que cada sujeito constrói em si e no outro através da linguagem,
seja ele portador ou não de alguma deficiência.
Infelizmente a sociedade
assimila aos poucos que a pessoa com necessidades especiais apresenta
dificuldades inerentes aos seres humanos e não somente em razão de sua
deficiência orgânica. A sociedade deveria se preparar mais para receber,
oportunizar e respeitar a diversidade, as pessoas com necessidades especiais
devem ter todos os seus direitos assegurados, uma vez que transitam por
diferentes setores da sociedade, inclusive aos bens de consumo.
Acredito que uma
sociedade que consegue reconhecer e viver harmoniosamente com as várias
experiências humanas, configura-se como uma sociedade inclusiva. A limitação do
sujeito especial em alguns aspectos, não representa a limitação do seu direito.
Sabem qual o absurdo
disso tudo? É que a maioria das pessoas ditas "normais" não para para
pensar como se sente uma pessoa quando o mundo não a reconhece como um humano,
o seu modo de falar, de se expressar, de andar, de se locomover, de ver ou de
não ver. Que tipo de olhar somos capazes de enviar a alguém quando notamos, em
qualquer parte de seu corpo, algo que imediatamente desencadeia em nossas
mentes um processo para ressignificá-lo, para rever seu valor humano e, na sequência,
atribuir-lhe um valor de "menos humano"?
Pode ser uma prótese no
lugar do olho, um braço que não existe mais, a mancha grande e cabeluda na face.
O quanto revela de nós esse olhar, ao outro, que ao mesmo tempo é analítico,
julgador e envergonhado? Envergonhado porque tenta apagar os vestígios do
obscuro ritual que se passa no íntimo. Não que esse processo de avaliar quem é
mais humano ou menos humano, mais normal, menos normal, seja consciente, mas o
constrangimento que ele naturalmente gera, sim. O constrangimento reflete uma
verdade pouco nobre e bem escondida: somos educados para acreditar que existe
uma hierarquia entre condições humanas.
Pensando muito a fundo
sobre isso, me vem os seguintes questionamentos na cabeça:
-Seríamos então um
composto de percentuais variados de humanidade e devemos lidar com essa
informação sem traumas?
-Os nenês nascidos com
síndromes genéticas são menos humanos do que outros cujos cromossomos estão em
número e tamanho "corretos"?
-Alguém sem pernas é 60%
humano?
Atenta aqui e só
observando e esse assunto está longe de ser uma abstração.
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